Um conto sobre como uma experiência internacional transformou meu olhar sobre oportunidades.
“It defines the ecosystem”
The guardian
“The giants of the web assemble.”
The Wall Street Journal
Ir a eventos de startups, tecnologia e empreendedorismo é sempre uma experiência enriquecedora em todos os sentidos. Desde nossa primeira ida à Festuris 2022, evento anual do setor de turismo em Gramado, eu e a Trindtech temos colecionado festivais de inovação no currículo. Já participamos de edições do TDC, South Summit, Sapiranga Summit, Gramado Summit, entre outros. Nessas ocasiões, buscamos levar um pouco da nossa cultura de formação de pessoas para diferentes partes do país, compartilhamos cases e também transformamos cada evento em uma oportunidade de mentoria para os participantes — algo que tem sido fundamental para o meu crescimento desde o início.
Dessa vez, porém, alcançamos outro patamar: fomos selecionados para apresentar um stand no Web Summit Lisboa 2024, um dos maiores eventos de inovação e tecnologia do mundo. Embarcamos com a delegação brasileira da APEX Brasil, prontos para mergulhar em uma semana de aprendizados e descobertas. Entre palácios históricos, pitchs impecáveis em bares com as Ladies in Tech, caminhadas por Sintra para provar o famoso “Travesseiro” e conversas em inglês com vendedores, vivemos uma experiência transformadora.
Inscrição
Muitas dessas viagens começam muito antes de sabermos que iremos. Nesse caso, começou a apenas alguns meses atrás quando eu havia pego uma carona com o CEO da Trindtech, Diraci Jr., para Florianópolis onde eu iria passar uma semana de férias em comemoração aos meus 2 anos de empresa. Durante a viagem eu pergunto para o Dira como estavam as aulas de inglês – uma pergunta capciosa pra lembrar de praticar. Nisso, ele comenta que o progresso estava um pouco lento mas ainda sim indo, porém o desafio atual consistia em um pitch em inglês que ele deveria fazer para a submissão para um evento. Ele me conta então que já tinha tentado algumas vezes, mas se falar inglês já é difícil, tentar vender algo, lembrar de um roteiro e acertar a pronúncia, tudo ao mesmo tempo, era quase inviável para o tempo que ele tinha até o prazo da submissão.
Como toda quietude antes do caos, o assunto se dissipou pelos próximos 3 dias. Acontece que a carona só foi possível pois a empresa tinha enviado uma equipe de pessoas para o evento do mês, o Startup Summit em Florianópolis. Dentre os participantes estavam o CEO e, estreando, nossa mais nova CHRO e sócia da empresa, Juliet Bombassaro. Durante uma palestra do SEBRAE neste evento, o Diraci acabou descobrindo que na verdade outra pessoa poderia gravar o tal do pitch em inglês com apenas uma condição: a pessoa do vídeo deveria ir para o evento presencialmente representando a empresa.
E foi assim que eu, desenvolvedora de software, gravei um pitch de três minutos em inglês, após quatro horas de tentativas, correria para editar o vídeo e muitas risadas com erros de gravação. Poucos dias depois, recebemos a notícia: fomos uma das 80 startups brasileiras selecionadas pela ApexBrasil, SEBRAE, Ministério das Relações Exteriores (MRE) e Serpro para integrar a Comitiva Brasil no Web Summit Lisboa 2024.
Pré-evento
Deste momento em diante, veio toda a preparação, correria com papelada e levantamento de verba, pois, convenhamos, uma viagem para a Europa para três pessoas de um dia para o outro não é algo tão simples de se resolver. Isso resume uma boa parte da experiência dos dois co-fundadores com relação ao evento nesse período do nosso conto. Para mim, no entanto, havia outra preocupação: conciliar a faculdade presencial, semana de provas e documentação para sair do país.
A semana de provas ainda vai existir, o momento chega para todos. Os professores foram todos avisados do período fora e com muita compreensão conseguimos realocar as provas para a volta. Mais algumas semanas em volta da retirada do passaporte, organização de malas e roupas para o evento e combinações com a nossa equipe sobre o gerenciamento dos projetos na minha ausência e de repente eu estava dentro do avião em direção a Lisboa.
Web Summit Lisbon 2024
Depois de alguns dias descobrindo um pouco da cidade com a equipe, começamos nossa imersão em empreendedorismo e inovação com as startups da delegação da ApexBrasil. Entre palestras sobre internacionalização para Portugal e oportunidades de facilitação de processos financeiros e burocráticos para startups, conseguimos reforçar alguns contatos antigos da empresa e conhecer muita gente nova excepcional do Brasil inteiro. Muito networking em português, comida boa e lugares incríveis.
Honestamente, se voltássemos para casa nesse ponto, a viagem já teria sido muito bem aproveitada. Algo que aprendi nessa jornada é que os negócios são feitos nos relacionamentos e conexões que construímos com as pessoas que encontramos no caminho. São oportunidades entre uma conversa e outra, uma ponta solta em um modelo de negócio, uma dificuldade encontrada por um parceiro e uma empresa prestes a resolver com seus recursos. É sobre jogo de cintura e adaptabilidade.
Nos próximos três dias começamos nossa jornada internacional dentro do Web Summit. Fomos recepcionados com o friozinho de 5º C de Lisboa naquela semana, mas nada que um bom espírito gaúcho não pudesse segurar. O evento deste ano baseava-se em 6 pavilhões gigantescos onde cada um dividia-se entre países de contexto, pontos de encontro para comunidades, estandes de empresas classificadas por Alpha, Beta e Growth, stages de palestras e stands de empresas de médio porte e instituições. Ao longo do evento conseguimos organizar agendas de palestras que gostaríamos de participar através do app do evento, além de conversar com possíveis contatos e investidores e verificar os meetups com horário mais próximo.
Para as palestras e paineis, gostaria de ressaltar alguns sem iguais:
- Women in leadership com Antoinia Norman, Sara Almeida e Minna Taylor: palestra incrível sobre achar sua própria força, abraçar a feminilidade nas lideranças e dicas de carreira. Um pequeno palco que mulheres de todo mundo lotaram para ouvir;
- Climate resilience in the eye of the storm com Simone Stulp (Secretária de Inovação do Estado do Rio Grande do Sul): um overview sobre os dados das enchentes que assolaram o Rio Grande do Sul neste ano. Impossível controlar as lágrimas vendo o impacto do estrago que nossa comunidade passou, ficamos sem palavras;
- Design for everyone: Accessibility at Apple com Sarah Herrlinger: uma demonstração com cases da Apple de como o design feito com direcionamento à acessibilidade pode melhorar a qualidade dos produtos e fomentar a inovação dentro das empresas. Somos ajudados todos os dias por estratégias de acessibilidade.
A experiência com o inglês foi algo. Sempre tive uma relação boa com o inglês, mas nunca tinha tido a oportunidade de representar a empresa ou gerenciar situações em pessoa (não atrás de uma tela no remoto) em outra língua. O que posso dizer é que a gente cria um monstro na nossa cabecinha brasileira que, literalmente, não existe. O inglês é um ponto de encontro, um meio pra um fim. Nosso sotaque é o que nos diferencia e o que nos torna especiais, ele conta a história de onde viemos e para onde estamos indo. Houve momentos em que eu até tentei forçar o nosso “i” no final das palavras – como em “Facebooki”, “cati”, “smili”, só para ser lembrada como brasileira. É, de verdade, um dos meus maiores orgulhos poder mostrar que de onde eu vim tem educação, tem inovação, tem muita gente boa e bem versada.
Conclusão
Acredito que o processo de mentoria tenha começado assim que eu fui convidada a gravar o pitch. A proposta de ir além do meu limite e ter a oportunidade de errar ou de acertar é onde a transformação começou. Além disso, essa experiência trouxe a tona algumas perguntas fundamentais que até alguns meses atrás eu não acreditei que eu fosse me perguntar tão cedo, principalmente por recém ter iniciado na faculdade, por nunca ter saído do país, por ser agora a primeira pessoa da família a viajar pra europa e ter outros objetivos no momento:
“Como organizar uma alta demanda presencial acadêmica com um período tão grande de faltas? Como recuperar o conteúdo pós viagem? O que é necessário de documentação para sair do país? Já tenho um passaporte? Meu inglês está preparado para um possível pitch presencial? Tenho dinheiro para sustentar os gastos pessoais da viagem? O que isso significa pra minha carreira? Qual o meu papel nesse cenário? Como eu posso somar nessa viagem com as minhas skills? Como os projetos que trabalho vão ficar com a minha saída? Meus colegas estão instruídos para tocar a demanda na minha ausência?”
Em retrospecto, muitas dessas questões eu ainda não resolvi mesmo após o evento, minha vida não estava organizada para duas semanas fora dos compromissos. Algumas questões ainda estou trabalhando em cima e outras, mais práticas, obviamente tiveram que ser resolvidas a fim de facilitar a viagem. Mas o ponto é: eu não estava preparada antes do pitch, não estava preparada no evento, não estava preparada durante o evento e continuei achando que não estava preparada após. Muitas vezes vamos achar que não estamos preparados para oportunidades tão grandes ou que tudo foi uma grande jogada de sorte, mas algo que li a um tempo atrás sempre me vem à cabeça nessas situações: sorte é o encontro da preparação com a oportunidade. E no final do dia eu estava preparada sim. Tudo que eu construí me levou a esse ponto, só bastou coragem e boa companhia pra eu poder dizer agora que não só sei o gostinho do Pastel de Belém, como também posso representar com sucesso minha empresa em um dos maiores eventos internacionais de tecnologia e inovação.