Na virada do ano, quando conselhos administrativos e lideranças redefinem quem receberá investimento, atenção e tempo, decisões aparentemente técnicas moldam o futuro de pessoas reais, que estão por anos buscando um lugar ao sol. Porém, quem fica fora dos planos estratégicos? Quem é rotulado como “baixo desempenho” em sistemas que nunca consideraram desigualdades estruturais como variável relevante?
Essas perguntas não são filosóficas, são operacionais. Elas se materializam em sistemas automatizados de avaliação, em políticas internas de desempenho e em decisões de investimento que passam a tratar desigualdade estrutural como irrelevante ou, pior, como ruído estatístico.
Existe um risco silencioso em transformar o futuro em uma planilha: naturalizar a exclusão como resultado inevitável da eficiência. A história da eugenia nos ensina que projetos de futuro que ignoram justiça social tendem a repetir violências, mesmo quando embalados em linguagem moderna.
“No capitalismo, essa lógica não opera mais apenas no nível da exclusão direta, mas na promessa constante de inclusão condicionada. E, infelizmente, é o discurso mais vendido aos pobres que querem ascender na carreira”.
Lembro de diversas situações de pessoas que entram na lógica capitalista corporativa da meritocracia, fazendo o máximo para alcançar a “performance” e o “fit cultural” que a empresa diz ser necessária, porém a promoção e retorno financeiro nunca chega. Porque, a inclusão passa a ser sempre adiada: falta uma certificação, um curso, um MBA, uma nova competência. O acesso nunca é negado frontalmente, ele é permanentemente postergado.
Assim, gerando indivíduos com frustrações profissionais e psicológicas, que descobrem da pior forma após 4 ou 5 anos que, para pessoas que vem de onde elas vêm: o que se faz nunca será o suficiente e nunca fará parte efetivamente da planilha do planejamento estratégico.
Esse sentimento não é falha individual. É um efeito colateral previsível de um sistema que precisa manter uma parcela constante de pessoas fora do planejamento estratégico para continuar operando. Exemplo disso é quantidade de layoffs (demissões em massa) que ocorreram em cerca de 5.296 empresas em 2025. Na sua maioria, as empresas estão cortando pessoal principalmente para se tornar mais eficientes e competitivas frente a desafios econômicos e tecnológicos, em nome da inovação.
Se você não estiver dentro do que o mercado diz que você precisa ser, você não faz parte do futuro. Não há espaço para humanidade. Por isso, é importante refletir que se o futuro corporativo continuar sendo desenhado apenas por métricas de curto prazo e tecnologias que reproduzem o passado, não inovaremos, estaremos apenas acelerando velhas hierarquias e exclusões.
“Pensar o próximo ano exige mais do que novas metas. Exige perguntar quem está autorizado a fazer parte delas?”
Porque, no fim, o ano de 2026 nunca começa para todos ao mesmo tempo, e tecnologia alguma é capaz de corrigir isso se não houver, antes, uma decisão política clara: romper com a lógica de mercado de selecionar quem merece existir no amanhã.
Referências
INTELLIZENCE. Companies that announced Major Layoffs and Hiring Freezes. Intellizence, 26 dez. 2025. Disponível em: https://intellizence.com/insights/layoff-downsizing/major-companies-that-announced-mass-layoffs/. Acesso em: 29 dez. 2025.

