Coerência como liderança

Juliana Lazuta - Head de Cultura na Agência Bistrô

(Quando a escuta sustenta mais do que o discurso)

Estamos num tempo em que se fala demais e se escuta de menos. As promessas são públicas. A coerência, nem sempre. E é justamente aí que mora o desafio real da liderança: sustentar no cotidiano aquilo que se afirma com convicção nos encontros, nos documentos, nas reuniões de time.

Em tempos de muito discurso e pouco vínculo, a liderança que inspira não é a que impressiona, mas a que sustenta o que diz com constância. É na repetição silenciosa dos gestos, não nas frases de efeito, que uma cultura se forma, se fortalece ou se rompe.

Liderar não é saber tudo. Mas é, sim, mostrar o caminho, mesmo que esse caminho inclua dúvidas, revisões, mudanças de rota. Liderar também é manter o vínculo mesmo diante do erro. É o gesto que confirma a intenção. É a escuta que acontece apesar da pressa.

As pessoas não esperam líderes perfeitos. Confiam em quem é constante. Edgar Schein já dizia que a cultura de uma empresa está no que seus líderes reconhecem, toleram e ignoram todos os dias. Ou seja, no que fazem, não no que dizem que fazem.

A ciência não diz diferente. O relatório mais recente da Gallup, State of the Global Workplace2024, mostrou que a principal causa de estresse no trabalho está ligada à percepção de injustiça e à incoerência entre o discurso e a prática das lideranças.

Empresas percebidas como coerentes têm até 40% mais engajamento e índices significativamente menores de burnout. O dado não é sobre discurso. É sobre prática.

Na Agência Bistrô, temos buscado traduzir isso em ações concretas. Estimulamos feedbacks contínuos, alinhamentos frequentes, conversas abertas. Estruturamos um canal de denúncias que protege a escuta, mas também a coragem de quem escolhe falar. Porque confiança não se pede, se constrói. E só se constrói quando o cuidado é visível.

Liderança, afinal, não é carisma. É constância. E constância exige coragem.

Brené Brown nos lembra que vulnerabilidade não é fraqueza. É coragem em estado bruto. Estar presente com verdade, admitir que não se sabe, sustentar o cuidado mesmo sem ter respostas. Essa também é uma forma de liderar.

Cuidar da linguagem faz parte. A Comunicação Não Violenta nos ensina a descrever sem julgar, sentir sem atacar, pedir sem exigir. É um deslocamento sutil, mas profundo.

Em vez de “Você é desorganizado”, dizer: “Notei que esse projeto atrasou.”

Em vez de “Você me deixou na mão”, dizer: “Fiquei preocupada com a falta de retorno.” Em vez de “Você precisa melhorar”, dizer: “Preciso de mais previsibilidade para acompanhar.”

Esses detalhes moldam relações. Relações moldam culturas. E cultura, no fim, é o que sustenta tudo.

Como lembra Simon Sinek, as pessoas não compram o que você faz. Compram por que você faz. Líderes que alinham intenção, palavra e ação criam um campo de confiança em volta de si. E times não seguem quem impressiona. Seguem quem sustenta.

Liderar com coerência é repetir, todos os dias, o que importa. É agir como se alguém estivesse aprendendo a liderar só por te observar, porque provavelmente está.

Escolha hoje um gesto que alinhe sua fala com a sua prática. É assim que a liderança se sustenta.

E é assim também que se constrói ESG com verdade. Porque não existe transformação ambiental, social ou de governança onde a coerência ainda é exceção. A confiança institucional nasce de quem sustenta, mais do que de quem promete.

E por aí, na sua empresa, sua prática confirma o que você diz?

Referências

Brown, Brené. ThePowerofVulnerability, TEDxHouston, 2010.

Gallup. StateoftheGlobalWorkplace, 2024.

Rosenberg, Marshall. Comunicação Não-Violenta, Editora Ágora, 2006. Schein, Edgar H. OrganizationalCultureandLeadership, Jossey-Bass, 2010. Sinek, Simon. Start With Why, Penguin, 2009.

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Por Juliana Lazuta Head de Cultura na Agência Bistrô
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Head de Cultura e Atendimento com mais de 10 anos de experiência em comunicação, especializada em transformar negócios a partir da cultura organizacional. Multiplicadora do Sistema B e defensora de práticas ESG, acredita que uma cultura sólida e alinhada com propósito é a chave para a inovação e o sucesso dos negócios. Compartilha como empresas podem criar ambientes mais humanos e impactantes através da cultura.
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