Com apoio da Finep, CBA usa inteligência artificial para reduzir ação de fungo causador de toxinas na castanha-do-brasil

Iniciativa reflete o propósito do novo CBA de agregar valor e fortalecer as cadeias produtivas regionais, fomentando a geração de bionegócios e promovendo a bioeconomia na Amazônia. Foto: Divulgação/Finep.

Pesquisadores do Centro de Bionegócios da Amazônia (CBA) estão desenvolvendo uma técnica inovadora, utilizando inteligência artificial (IA) para reduzir a ação do fungo Aspergillus flavus, um dos microorganismos causadores da aflatoxina, um agente tóxico com presença bastante comum na castanha-do-brasil, popularmente conhecida como castanha-do-pará ou da amazônia. Essa iniciativa conta com o apoio da Financiadora de Estudos e Projetos – Finep, por meio do Edital de Subvenção Econômica à Inovação – Bioeconomia e Transformação Digital da Amazônia (01/22).

Reconhecida mundialmente como um alimento funcional, a castanha-do-brasil é rica em selênio, proteínas e gorduras saudáveis, além de possuir propriedades antioxidantes que contribuem para a saúde cardiovascular e o sistema imunológico. Além disso, é uma excelente opção para dietas equilibradas, graças ao seu alto teor de proteínas, gorduras boas e minerais como magnésio e fósforo.

Apesar de seus inúmeros benefícios, a cadeia produtiva da castanha enfrenta desafios relacionados à contaminação por aflatoxinas, ora pela ação do Aspergillus flavus, ora pelo Aspergillus parasiticus. Essas substâncias estão entre os principais fatores que comprometem a qualidade das sementes extraídas dos ouriços e podem causar sérios riscos à saúde humana, entre elas o câncer.

O gerente do Núcleo de Produtos Naturais do CBA, Edson Pablo Silva, explica que a contaminação da castanha ocorre quando microrganismos entram em contato com os ouriços e através de fissuras formadas durante as quedas das árvores, conseguem penetrar nas sementes. Embora a castanha tenha uma casca resistente, ela não está imune à ação dos fungos. “Quando o ouriço cai das castanheiras, ele é, teoricamente, estéril. No entanto, as quedas de alturas de 30 a 40 metros causam fissuras que permitem o contato com o solo, onde existem inúmeros microrganismos, incluindo os fungos produtores de toxinas. Entre eles, o Aspergillus flavus é o maior problema, pois produz as aflatoxinas, substâncias tóxicas e cancerígenas, capazes de causar reações graves e até mesmo levar à morte”, explica Edson.

Os estudos realizados pelo CBA têm como objetivo reduzir os níveis de toxinas em sementes contaminadas, utilizando processos de inativação dos microrganismos ou até de quebra molecular para neutralizar as aflatoxinas. “Nosso objetivo é diminuir os níveis dessas toxinas a limites aceitáveis, quebrando suas moléculas e diluindo sua concentração. Assim, pretendemos garantir um produto mais seguro e viável comercialmente”, afirma o pesquisador.

Edson destaca que um dos maiores desafios da cadeia produtiva da castanha está no cumprimento das exigências higiênico-sanitárias. “A presença de microrganismos, como fungos e bactérias, é um entrave para a comercialização. Se um lote apresenta níveis de aflatoxinas acima do permitido pela legislação, ele é totalmente rejeitado, causando prejuízos. Nosso trabalho visa melhorar o processamento dentro da cadeia produtiva, tornando-a mais competitiva e ampliando o impacto para outras cadeias produtivas no futuro”.

O Codex Allimentarius – conjunto de normas internacionais, diretrizes e códigos de práticas relacionados à segurança alimentar, qualidade dos alimentos e práticas justas no comércio internacional de alimentos – estabelece como limites máximos de aflatoxinas em castanhas, 15 microgramas de aflatoxinas totais por quilo do produto para posterior processamento e 10 microgramas de aflatoxinas totais por quilo do produto pronto para o consumo.

A norma instituída pela Organização das Nações Unidas para a Alimentação e a Agricultura (FAO) e pela Organização Mundial da Saúde (OMS) atende aos padrões apontados pelos países produtores como sendo de tolerância máxima de contaminação e assegurou a retomada das importações por parte da União Europeia junto ao Brasil.

Cadeia produtiva relevante

O Amazonas é o maior produtor de castanha-do-brasil no País. Dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indicam que o estado alcançou uma produção de 11.291 toneladas em 2023. Acre e Pará ocupam o segundo e terceiro lugares, com 9.473 e 9.390 toneladas, respectivamente. Juntos, os três estados respondem por 80% da produção nacional, consolidando-se como o núcleo principal do extrativismo da castanha.

No Amazonas, os municípios de Tapauá, Beruri e Tefé concentram a maior quantidade de produtores, sendo referência na produção de sementes de alta qualidade.

Parcerias estratégicas

Os estudos desenvolvidos pelo CBA para reduzir os índices de contaminação das aflotoxinas da castanha-do-brasil contam com o apoio da Getter S.A, uma startup que atua com ênfase na saúde e segurança do trabalho, gestão de processos e controle de qualidade por meio da aplicação de Inteligência Artificial. Essa é a primeira iniciativa da empresa no âmbito da Bioeconomia.

Entusiasta do projeto, o CEO da Getter, Rufo Pagani, destaca que o CBA desempenha um papel essencial ao oferecer suporte em áreas onde a startup enfrenta limitações, como na estrutura laboratorial para certificação de práticas na bioeconomia. “O CBA faz a ponte necessária para complementar nossa pesquisa, que busca solucionar um problema crítico que impacta diretamente as comunidades ribeirinhas e indígenas. Essas comunidades desempenham um papel fundamental na preservação da floresta e no extrativismo sustentável, mas enfrentam dificuldades para exportar suas castanhas. Muitas vezes, acabam vendendo o produto a preços baixos para a Bolívia, que realiza o beneficiamento e revende à Europa com uma margem de lucro significativa”.

Rufo explica que a tecnologia em desenvolvimento pela Getter se propõe a aplicar uma técnica de luz UV para descontaminar a castanha e fazer a verificação de sua qualidade, por meio de técnica que será validada com todo o suporte laboratorial do CBA. “Nós estamos criando uma máquina que descontamina e também avalia o tamanho e a característica da castanha, se ela tá quebrada, pequena, média, grande. E mensura a quantidade produzida, de onde veio essa castanha, gera uma rastreabilidade desse produto e garante os padrões de qualidade para uma exportação do produto”.

A Abufari Produtos Amazônicos, uma agroindústria especializada no beneficiamento e comercialização de castanhas também integra a parceria com o CBA e a Getter. Com sede em Tapauá, município distante 448 quilômetros de Manaus, localizado na região do Alto Solimões, a empresa se destaca pela excelência na qualidade das sementes extraídas, reforçando o papel da região como um polo de referência para o setor.

“Todo e qualquer desenvolvimento tecnológico que nos permita aperfeiçoar a nossa cadeia produtiva agroindustrial é sempre muito importante, não só pelo fator da qualidade da produção, mas também no sentido de desenvolver novas tecnologias e aplicá-las ao nosso processo agroindustrial”, explica o diretor da Abufari, Leonardo Baldissera.

Atualmente, o projeto está na fase 1 em que os pesquisadores estão atuando na caracterização do produto, ajuste das metodologias e na construção do equipamento que vai auxiliar na redução da atuação do fungo.

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