Governança colaborativa: o futuro das startups em construção

Pedro Barbosa - editor
Transparência e inclusão são elementos fundamentais para a governança estratégica das startups.

Apesar de sua crescente relevância no mundo dos negócios, a governança colaborativa ainda é um tema pouco debatido no Brasil, especialmente no ecossistema de startups, onde decisões rápidas e inovação são cruciais. Neste sentido, a governança colaborativa pode ser um diferencial competitivo, ajudando a alinhar interesses e a construir uma base sólida para o futuro. Ao contrário das práticas tradicionais de governança, que frequentemente centralizam decisões em um núcleo restrito, a governança colaborativa propõe uma abordagem mais horizontal, promovendo a participação ativa de diferentes atores – sejam eles fundadores, gestores, conselheiros ou investidores.

O Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC), define governança corporativa como um “sistema formado por princípios, regras, estruturas e processos pelo qual as organizações são dirigidas e monitoradas, com vistas à geração de valor sustentável para a organização, para seus sócios e para a sociedade em geral”. A instituição criou uma ferramenta gratuita de autoavaliação para medir o nível de aderência às melhores práticas de governança corporativa de acordo com o tipo de empresa, seja ela de capital fechado, startup ou scale-up.

O estudo Startups & scale-ups: maturidade em governança – uma pesquisa que retrata o panorama do ecossistema brasileiro, realizado pela Better Governance, consultoria especializada em governança, aponta que 82,4% das startups e scale-ups brasileiras ainda estão nos estágios iniciais em governança corporativa. Os estudos também mostram que a mortalidade das startups é alta no país, com apenas 25% delas sobrevivendo após 10 anos de existência, em média.

Em um mercado altamente competitivo e com altas taxas de mortalidade entre startups, a implementação de práticas de governança eficazes pode ser o diferencial entre o sucesso ou o fracasso de um negócio. A metodologia desenvolvida pela Better Governance no Modelo de Maturidade em Governança, criada a partir dos conceitos propostos pela matriz de progressão em governança para pequenas e médias empresas do International Finance Corporation (IFC), estabelece práticas em seis dimensões de governança:

  • Comprometimento com ESG e cultura.
  • Tomada de decisão e monitoramento estratégico.
  • Ambiente de controle.
  • Divulgação e transparência.
  • Propriedade.
  • Engajamento com stakeholders.

Esses pilares são fundamentais para orientar startups brasileiras em direção a uma governança mais estruturada. Contudo, vale observar como ecossistemas internacionais já avançaram nesse campo. Países como os Estados Unidos e Israel, por exemplo, têm se destacado pela implementação de práticas colaborativas que vão além dos modelos tradicionais, trazendo importantes lições para o contexto nacional. Incorporar essas práticas no Brasil pode ser um caminho promissor para fortalecer as startups locais, especialmente em um ambiente cada vez mais globalizado e competitivo.

No entanto, a falta de alinhamento sobre a visão de longo prazo, distribuição de dividendos e profissionalização da gestão estão entre as causas mais frequentes de conflitos em conselhos de administração. Segundo a especialista em desenvolvimento profissional e mudanças organizacionais, Susana Azevedo, quando estes pontos não são discutidos com transparência, a governança pode se tornar instável, comprometendo a eficiência e o engajamento dos colaboradores. “A governança desempenha um papel crucial nesse processo, especialmente no alinhamento estratégico entre acionistas, conselhos e equipes de liderança”, destaca.

Especialista em desenvolvimento profissional e mudanças organizacionais, Susana Azevedo.

Susana é sócia da Quantum Development, uma consultoria com foco em empresas familiares de médio porte e executivos de grandes empresas, que ajuda organizações a transformar suas visões e planos em realidade, conectando diferentes elementos da estrutura empresarial. “Apoiamos lideranças a fazer os ajustes necessários para responder às realidades do ambiente organizacional. Isso inclui tanto o desenvolvimento individual quanto coletivo, utilizando conversas estruturadas como ferramenta para alinhar expectativas e criar uma visão compartilhada”.

Neste sentido, o papel da consultoria é conectar os diversos elementos que compõem a engrenagem de uma organização. Por um lado, a visão de negócio e a estratégia; por outro, a cultura organizacional. “Trabalhamos para engajar os executivos, tanto os líderes de topo quanto as equipes de liderança, em diálogos que permitam clarificar essas conexões”, completa Susana.

Esses diálogos incluem o ecossistema de stakeholders, adotando uma visão sistêmica para alinhar dinâmicas de comunicação e práticas de governança. O objetivo é construir uma base sólida para o desenvolvimento das competências técnicas e comportamentais necessárias, tanto individuais quanto coletivas, a fim de sustentar uma cultura organizacional que apoie a liderança. “Essa liderança, por sua vez, é a responsável por implementar a estratégia e alcançar o propósito e a visão da organização”, reforça Susana.

Transparência é a chave

Enfrentar e discutir os assuntos difíceis é essencial num modelo de governança colaborativo. Nesta hora, para o CEO do Grupo Leveros, Tiziano Pravato Filho, agir com transparência é fundamental. “Fala-se muito sobre investimento, mas a grande questão nas relações de sócios é trazer a realidade à tona e ter as conversas difíceis. No Brasil, especialmente, há uma tendência a evitar conflitos”.

CEO do Grupo Leveros, Tiziano Pravato Filho.

O Grupo Leveros foi idealizado por Tiziano Pravato em 1978 como uma prestadora de serviços autorizados para a Brastemp. Atualmente a empresa atua em nível nacional no setor de climatização, com foco em distribuição de ar-condicionado por meio de lojas físicas e marketplaces. Seu diferencial está no desenvolvimento de soluções tecnológicas voltadas para vendas, operações de serviço e gestão, com o propósito de profissionalizar e capacitar os prestadores de serviço. “Um dos grandes pontos do nosso grupo é que, como a nossa origem, meu pai fundou a empresa, nascemos como prestadores de serviço. A gente traz para o mercado o propósito de elevar o nível de profissionalismo no setor, capacitando parceiros para vender, instalar e crescer com eficiência”, explica Pravato Filho.

Em 2016, o Grupo Leveros recebeu investimento da 2B Capital, fundo de private equity controlada pelo Bradesco, que trouxe não apenas recursos financeiros, mas também uma nova dinâmica de governança e estratégia para a empresa. “Essa experiência foi o ponto de partida para minha jornada em conselhos e no relacionamento com investidores financeiros”, destaca Pravato Filho.

Ao perceber uma oportunidade de mercado, em 2023, o Grupo Leveros aportou R$ 10 milhões na Uappi, empresa especializada em oferecer soluções de e-commerce com atuação nacional. Pravato Filho explica que a operação teve como objetivo unir expertises para ambos os negócios, potencializando operações e estratégias. “Atualmente, possuímos 25% da Uappi e eu atuo como membro do conselho, contribuindo principalmente para direcionar seu crescimento e estratégia, ainda que participe menos do dia a dia operacional”.

Tendo atuado tanto como investidor quanto como representante de empresas investidas, Pravato Filho destaca o desafio significativo de migrar de um modelo tradicional de acordo de acionistas para uma governança mais dinâmica, orientada por estratégia e inovação. Para ele, os acordos de acionistas convencionais geralmente focam em aspectos jurídicos e formais, como gestão de riscos, governança básica e até situações de falência. No entanto, tende a definir muito pouco sobre a dinâmica do conselho em si – como ele funciona na prática, a interação entre os membros e as decisões estratégicas. “Essa lacuna pode ser sentida desde os primeiros momentos da jornada empresarial e precisa ser endereçada para garantir que o conselho atue de forma efetiva e alinhada com os objetivos da organização”, destaca o CEO do Grupo Leveros.

Fique de olho

A governança colaborativa não é apenas uma tendência, mas uma necessidade no ambiente competitivo das startups. Empresas que adotam práticas transparentes, estratégicas e inclusivas têm maior potencial de criar valor sustentável e superar os desafios do mercado. Nos próximos artigos da série Governança Colaborativa em Startups, exploraremos mais sobre o ambiente de controle, tomada de decisão e monitoramento estratégico para ajudar a construir essa governança na prática.

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Jornalista e Mestre em Comunicação, ambos pela Unisinos. Possui pós-graduação - MBA em Design Digital e Branding e pós-graduação em Gestão da Tecnologia da Informação, ambos pela Uninter. Já atuou no setor público e privado, tendo trabalhado no governo do Estado do Rio Grande do Sul, com deputados estaduais, federais, no Jornal NH e no Parque Tecnológico São Leopoldo - Tecnosinos.
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